11.24.2012

Jejum faz bem para você?



Jejum faz bem para você?



O jejum é mais comumente associado com a observação religiosa. Por exemplo, é o quarto dos cinco pilares do Islã. Os budistas o consideram um meio para a prática de autocontrole e defendem a abstenção de comida após a refeição do meio-dia.
Para alguns cristãos, jejuns temporários são vistos como uma maneira de se aproximar de Deus.

Sim, jejum e religião são intimamente ligados, mas pesquisas científicas recentes têm apontado que seus benefícios também podem ser mais corpóreos.
A ideia de que o jejum pode ser bom para a saúde tem uma história conturbada, no entanto. Em 1908, Linda Hazzard, uma americana com alguma formação de enfermagem, publicou um livro chamado “Fasting for the Cure of Disease” (em português, “o jejum para a cura da doença”), no qual alegou que comer o mínimo possível era o caminho para a recuperação de uma variedade de doenças, incluindo o câncer.
Ela foi presa depois que um de seus pacientes morreu de fome. Ok, ela era questionável. Mas e se estava, pelo menos em parte, certa?
Uma nova série de pesquisas sobre jejum sugere que ele pode realmente ajudar pessoas com câncer, além de reduzir o risco de desenvolvimento de câncer, proteger contra diabetes e doenças cardíacas, ajudar a controlar a asma e até mesmo evitar doença de Parkinson e demência.
Muitos dos cientistas que estudam o jejum acreditam que ele pode ser útil especialmente na meia idade. “Nós sabemos a partir de modelos animais, que, se iniciarmos uma dieta com jejum no que seria o equivalente a meia idade nas pessoas, podemos retardar o aparecimento de doenças como Alzheimer e Parkinson”, explica Mark Mattson, do Instituto Nacional sobre o Envelhecimento dos EUA.
Apesar de ajudar na saúde mental, não há evidência que o jejum prolongue a vida dos seres humanos. Em laboratório, o tempo de vida de animais cuja ingestão de caloria foi diminuída pela metade aumentou em até 50%. Mas esses efeitos não parecem se estender aos primatas, já que um estudo de 23 anos com macacos descobriu que, embora a restrição de calorias retardasse o aparecimento de doenças relacionadas à idade, não teve nenhum impacto nas suas vidas úteis. Isso pode indicar que outros fatores além da dieta, como a genética, podem ser mais importantes para a longevidade humana.

O jejum

Há quem argumente que somos evolutivamente adaptados para ficar sem comer de vez em quando, já que nossos antepassados talvez nem comessem todos os dias. “A evidência é muito forte de que os nossos ancestrais não comiam três refeições por
dia, além de lanches”, afirma Mattson. “Nossos genes são adaptados para lidar com períodos de falta de alimento”.

Fazer jejum, no entanto, não é fácil. No geral, os pesquisadores concordam que o jejum vai lhe deixar mal humorado a curto prazo, porque leva tempo para o seu corpo quebrar hábitos psicológicos e biológicos.
O problema é que eles já não concordam tanto sobre os demais efeitos do jejum. Para começo de conversa, existem vários tipos de dieta com jejum.
A título de comparação, a ingestão diária normal recomendada é de cerca de 2.000 calorias para uma mulher e 2.500 para um homem.
Em um dos mais tranquilos tipos de jejum, a dieta “5:2″, as pessoas podem comer apenas 600 calorias em uma única refeição por dia durante dois dias da semana, podendo comer o que quiserem nos outros 5 (tendo em mente que jejum não é só sobre perder peso).
Outras dietas mais severas têm restrições calóricas todos os dias, e há também o jejum total, em que as pessoas ficam sem nenhuma comida de um a cinco dias – mais do que isso é considerado potencialmente perigoso. O jejum pode ser uma experiência única, pode ser repetido semanalmente ou mensalmente.
Cada dieta tem efeitos diferentes sobre o corpo. O jejum começa cerca de 10 a 12 horas sem comer após uma refeição, quando você já usou toda a glicose disponível no seu sangue. Seu corpo começa a converter o glicogênio armazenado no fígado e nas células musculares em glicose, para usar como energia.
Se o jejum continua, há um movimento gradual para quebrar a gordura corporal armazenada, e o fígado produz “corpos cetônicos”, moléculas que são subprodutos da quebra de ácidos graxos. Elas podem ser usadas pelo cérebro como combustível.
Em três a quatro dias em um jejum, vários hormônios também são afetados. Por exemplo, a produção de fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1 (IGF-1) atinge níveis muito baixos. A insulina também se torna escassa.
Enquanto isso, níveis elevados de ambas as substâncias têm sido associados ao câncer.

Jejum x câncer

Poderia o jejum então prevenir contra o câncer? Não sabemos direito ainda, mas há algumas boas razões para acreditarmos que sim.
Altos níveis de IGF-1, insulina e glicose no sangue, além de excesso de peso, são fatores de risco para o câncer, e todos podem ser melhorados através do jejum.
Michelle Harvie da Universidade de Manchester, no Reino Unido, estudou mulheres com histórico familiar (e portanto risco elevado) de câncer de mama colocando-as em jejum. Metade fez uma dieta que envolveu o corte de calorias em cerca de 25%, e metade fez a dieta de jejum 5:2.
Após seis meses, ambos os grupos mostraram uma redução nos níveis de insulina no sangue, mas a redução foi maior no grupo em jejum. Harvie está agora analisando biópsias de mama para ver se as diferenças se traduziram em menos mudanças genéticas associadas com maior risco de câncer.
Já para combater câncer existente, Valter Longo, diretor do Instituto de Longevidade da Universidade do Sul da Califórnia (EUA), acredita que jejuns totais de curto prazo apresentam os maiores benefícios.
Em um estudo de laboratório, um jejum total de 48 horas retardou o crescimento de cinco dos oito tipos de câncer em camundongos. O efeito foi mais pronunciado quanto mais jejuns os animais fizeram.
O jejum é uma dificuldade maior para as células cancerígenas do que para as normais. Isso porque as mutações que causam câncer levam a um rápido crescimento nas condições fisiológicas em que ocorreram, mas podem estar em desvantagem quando essas condições mudam.
Isso também poderia explicar por que o jejum combinado com o tratamento convencional do câncer dobrou as chances dos animais. Os ratos com gliomas – um câncer muito agressivo e o tumor cerebral mais frequentemente diagnosticado em humanos – eram mais de duas vezes mais propensos a sobreviver que os outros durante o período do estudo (28 dias), se tivessem feito jejum de 48 horas ao mesmo tempo em que a terapia de radiação.
Já existem estudos avaliando o impacto do jejum em pessoas com câncer. Os primeiros resultados são promissores. Segundo Longo, pacientes em estágios avançados de câncer que não podem esperar pelas conclusões finais podem discutir o jejum com seu oncologista.

Outras doenças, a mesma cura

Insulina alta também está associada com diabetes tipo 2, por isso não é surpresa que o jejum seja uma promessa contra essa condição também.
Benjamin Horne, do Intermountain Heart Institute (EUA), descobriu que 24 horas de jejum apenas com água uma vez por mês aumenta os níveis de hormônios de crescimento humano que provocam a quebra de gordura para uso energético, reduzindo os níveis de insulina e outros marcadores metabólicos da glicose.
Como resultado, as pessoas perdem peso e seu risco de contrair diabetes e doença cardíaca coronária é reduzido.
Jejum em dias alternados (com um almoço de 500 calorias para mulheres e 600 calorias para homens em dias de jejum) tem benefícios semelhantes, de acordo com Krista Varady, da Universidade de Illinois, em Chicago (EUA). O jejum melhorou os níveis de “colesterol ruim” e pressão arterial em participantes do estudo que fizeram uma dieta com baixo teor de gordura ou alto teor de gordura nos dias normais.
Para as pessoas que estão acima do peso, qualquer tipo de dieta com jejum provavelmente ajudará a reduzir o risco de diabetes e problemas cardiovasculares. Outro estudo também mostrou que pessoas obesas com asma se beneficiam de uma melhora dos sintomas com o jejum.
Já se o jejum beneficiaria pessoas com asma na faixa de peso normal ou com outras condições associadas com uma resposta imune hiperativa, os pesquisadores não sabem.
Quanto a diabetes e doenças cardíacas, alguns cientistas suspeitam que o jejum pode não ser tão benéfico nesse sentido para as pessoas de peso normal, uma vez que elas são mais propensas em já estar em boa forma, metabolicamente falando.

Bom para o cérebro

Um efeito do jejum, entretanto, pode beneficiar a todos: boa saúde mental. Como já dissemos acima, jejum parece ser bom para o cérebro.
Animais que ficam sem comer por um dia inteiro se tornam mais ativos. O jejum é um estressor leve que motiva o animal a aumentar a atividade no cérebro.
Estudos mostram que, em dietas de jejum em dias alternados com uma refeição única de cerca de 600 calorias no dia de jejum, a produção de uma proteína envolvida na geração de novas células cerebrais, que desempenha um papel na aprendizagem e na memória, pode aumentar de 50 a 400% dependendo da região no cérebro.
Jejum também pode proteger as células cerebrais de alterações associadas ao mal de Alzheimer e de Parkinson. Em ratos geneticamente modificados para desenvolver sintomas dessas doenças, o jejum em dias alternados na meia-idade atrasou o início de problemas de memória em cerca de seis meses, o equivalente a 20 anos nas pessoas.

Jejum: fazer ou não fazer?

Primeiro, ouvimos falar que é bom comer a cada duas ou três horas, depois, que o café da manhã é a refeição mais importante do dia, agora, que precisamos jejuar… O que realmente devemos fazer?
Mattson acredita que o conselho comum de começar o dia com um bom café da manhã é falho. Os estudos que valorizam essa refeição foram baseados em crianças, alunos que normalmente tomam café da manhã, ou seja, seu fraco desempenho pode ser simplesmente devido aos efeitos nocivos que ocorrem quando as pessoas começam o jejum.
De qualquer maneira, quem quer jejuar precisa ser cauteloso. “Nós ainda não sabemos exatamente quem pode ou deve estar em jejum, quantas vezes ou quantos dias por semana”, explica Harvie.
Além disso, a prática não está isenta de riscos. Um estudo com ratos, por exemplo, descobriu que jejum em dias alternados por seis meses reduziu a capacidade do coração dos animais de bombear sangue.
Há também o fato de que fazer jejum é muuuuito difícil. A boa notícia é que os pesquisadores estão estudando uma forma de aproveitarmos alguns dos benefícios de saúde do jejum sem precisar nos privar de alimentos. Por exemplo, fortes evidências relacionam o consumo alto de proteína com câncer. Uma dieta de restrição de proteína poderia potencialmente diminuir os níveis de IGF-1, como visto no jejum.[NewScientist]

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