A RIA DE AVEIRO - A PAISAGEM
Porque via rápida está a evoluir o Concelho de Aveiro, uma vez que a Câmara Municipal tem tantas por onde escolher? |
A ria é um enorme pólipo com os braços
estendidos pelo interior desde Ovar até Mira. Todas as águas do Vouga, do
Águeda e dos veios que nestes sítios correm para o mar encharcam nas terras
baixas, retidas pela duna de quarenta e tantos quilómetros de comprido,
formando uma série de poças, de canais, de lagos e uma vasta bacia salgada.
De um lado o mar bate e levanta
constantemente a duna, impedindo a água de escoar; do outro é o homem que junta
a terra movediça e a regulariza. Vem depois a raiz e ajuda-o a fixar o
movimento incessante das areias, transformando o charco numa magnífica estrada,
que lhe dá o estrume e o pão, o peixe e a água da rega. Abre canais e valas.
Semeia o milho na ria. Povoa a terra
alagadiça, e à custa de esforços persistentes, obriga a areia inútil a renovar
constantemente a vida. Edifica sobre a água, conquistando-a, como na Gafanha,
onde alastra pela ria. Aduba-a com o fundo que lhe dá o junco, a alga e o
escasso, – detritos de pequenos peixes. Exploram a ria os mercantéis, que fazem
o tráfego da sardinha, os barqueiros que fazem os fretes marítimos, os
rendeiros das praias que lhe aproveitam os juncais, os marnotos, que se
empregam no fabrico do sal, os moliceiros, que apanham as algas, e finalmente
os pescadores da Murtosa, que são os únicos a quem se pode aplicar este nome, e
que entre outras redes usam a solheira, a rede de salto, a murgeira e a
branqueira.
O homem nestes sítios é quase anfíbio: a
água é-lhe essencial à vida e a população filha da ria e condenada a
desaparecer com ela. Se a ria adoece, a população adoece.
Segundo Pinho Leal, em 1550, Aveiro
tinha doze mil habitantes e armava 150 navios. A barra entulha-se, a terra
decai. Em 1575, com a barra outra vez entupida, os campos tornam-se estéreis e
a cidade despovoa-se. A alma desta terra é na realidade a sua água.
A ria, como o Nilo, é quase uma
divindade. Só ela gera e produz. Todos os limos, todos os detritos vêm
carreados na vazante até à planície onde repousam. Isto é água e estrume, terra
vegetal que se transforma em leite e pão. Palpa-se a camada de terra gordurosa
sobre a areia. E além de fecundar e engordar, a ria dá-lhes a humidade durante
todo o ano, e com a brisa do mar refresca durante o Estio as plantas e os
seres.
Uma atmosfera de humidade constante
envolve a paisagem como um hálito. Ninguém aqui vem que não fique seduzido, e noutro
país esta região seria um lugar de vilegiatura privilegiado. É um sítio para
contemplativos e poetas: qualquer fio de água lhes chega e os encanta. É um
sítio para sonhadores e para os que gostam de se aventurar sobre quatro tábuas,
descobrindo motivos imprevistos. É-o para os que se apaixonam pelo mar
profundo, e para os medrosos que só se arriscam num palmo de água – porque a
ria é lago e mar ao mesmo tempo. Com meios muito simples, um saleiro e uma
barraca, tem-se uma casa para todo o Verão. Pesca-se. Sonha-se. Toma-se banho.
E esquece-se a vida prática e mesquinha. Dorme-se ao largo, deitando-se a fateixa
ou abica-se ao areal: um fogaréu, uma vara, a caldeirada... Começam a luzir no céu
e na ria ao mesmo tempo miríades de estrelas. Vida livre dalguns dias, de que
fica um resíduo de beleza que nunca mais se extingue. É a ria também sítio para
os que querem descobrir novas terras à proa do seu barco e para os que amam a
luz acima de todas as coisas. Eu por mim adoro-a. É-me mais necessária que o
pão. E é este talvez o ponto da nossa terra onde ela atinge a beleza suprema.
Na ria o ar tem nervos. A luz 24 hesita e cisma e esta atmosfera comunica
distinção aos homens e às mulheres, e até às coisas, mais finas na claridade
carinhosa, delicada e sensível que as rodeia. A luz aqui estremece antes de
pousar...
Fonte: Os Pescadores, Raul Brandão,
Edição de 21 de Julho de 1920
Comentários: tudo o que se possa
escrever sobre Aveiro, sobre a beleza da sua Ria, será pouco. Na verdade, a
cidade já foi mais dinâmica em relação ao que é no presente.
Os dois quartéis militares que mantinham
em Aveiro milhares de soldados, acabaram há anos. A carreira de tiro na Gafanha
de Aquém desapareceu, como a que existiu na localidade de Olho de Água.
Nesta área o que Aveiro ainda têm é a
Base de S. Jacinto (Paraquedistas) e no B.I.A. (Brigada de Infantaria de
Aveiro), ocupado pelo Destacamento Territorial da G.N.R.
Conclusão, Aveiro regista alguma dinâmica,
sim, aos fins-de-semana, Domingos e Feriados, sendo na sua os visitantes de
nacionalidade espanhola.
Postado por Joaquim Carlos, Coordenador
do Projecto Imagem e Comunicação, podendo as imagens aqui disponibilizadas ser
usadas na condição de que seja feita referência da sua fonte de origem.
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