Incumprimento
Foram mais de 4500 assinaturas da
sociedade civil recolhidas por 57 associações que subscreveram o projecto-lei
que deu origem ao «Estatuto do Dador de Sangue» consubstanciado na Lei nº
37/2012, de 27 de Agosto.
Delineada em Viana do Castelo, por ter
sido a ADSDVC – Associação de Dadores de Sangue do Distrito de Viana de
Castelo a primeira subscritora, tendo o signatário dado o seu
contributo enquanto ainda era detentor de responsabilidade directiva na ADSBA
– Associação de Dadores de Sangue do Barlavento do Algarve.
Mário Freitas* |
Acontece porem que, decorrido cerca de
17 meses após a sua publicação, a Lei nº 37/2012 ainda não foi objecto de
regulamentação pelo Ministério da Saúde, muito embora, no seu artigo 10º
estabeleça que a lei, publicada em 27 de Agosto de 2012, seja regulamentada
pelo Ministério da Saúde no prazo de 90 dias após a sua publicação. O disposto
neste artigo tem vindo a ser flagrantemente violado pela tutela que não
procedeu à regulamentação da lei no prazo nela consignado, nem posteriormente.
O Barlavento em particular e o Algarve
em geral é das poucas, senão a única, Região do país auto-suficiente em sangue.
Condição que poderá cessar por falta de regulamentação do Estatuto do Dador de
Sangue por causar imensos prejuízos à dádiva e à colheita de sangue uma vez que
a situação actual tem retraído e afastado, em geral, o dador a nível regional e
nacional cuja taxa se fixa, actualmente, em 16% de perdas.
Entre as situações de facto abrangidas
pela Lei nº 37/2012 que carecem de regulamentação e os factores que têm
afastado o dador de sangue encontram-se os seguintes (entre outros):
1. A dispensa do trabalho:
Em Portugal continental apenas os
militares beneficiam de um período de 5 dias de ausência ao trabalho em consequência
de cada dádiva; os civis não beneficiam de qualquer incentivo equiparável,
apesar do estabelecido na alínea g) do artigo 6º do Estatuto do Dador de Sangue
que se limita ao “tempo considerado necessário para o efeito, sem qualquer perdas de
direitos ou regalias do trabalhador dador” período que nem sequer é
quantificado; ao invés, os dadores das Regiões Autónomas da Madeira e dos
Açores beneficiam de períodos de dispensa do trabalho (2 dias) já
regulamentado.
2. O seguro do dador:
Em
Portugal continental o dador de sangue não beneficia de qualquer seguro que
cubra todas as situações anómalas resultantes dádiva ou de acidentes que
eventualmente sofra no trajecto para o local da colheita, e vice-versa, quando
para tal for chamado pelos serviços competentes; isto, apesar do
disposto na alínea h) do artigo 6º da Lei nº 37/2012, de 27 de Agosto, que
prevê abstractamente a existência de um seguro do dador, que não existe na
prática; porém, os dadores das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores já beneficiam
desse tipo de seguro, situação que se encontra devidamente regulamentada há
vários anos.
3. A taxa moderadora:
Apesar do disposto na alínea f) do
artigo 6º do Estatuto do Dador de Sangue, que apenas prevê a isenção de taxas
moderadoras no acesso às prestações do Serviço Nacional de Saúde nos termos da
legislação em vigor, os dadores de Portugal continental continuam a pagar taxas
moderadoras nas consultas hospitalares (com excepção da primeira consulta) e
pela realização do serviço, constituindo estas situações o grosso da coluna em
termos de dádivas e colheitas nacionais; só este factor de per si tem afastado
muitos milhares de dadores portugueses que outrora doaram sangue mas deixaram
de o fazer com a publicação do Decreto-lei nº 113/2011, de 29 de Novembro.
Estas
situações preocupam, em geral, as associações nacionais de dadores de sangue
que lidam diariamente com as repercussões da falta de regulamentação da lei que
aprovou o Estatuto do Dador de Sangue em Portugal continental, e ofendem os
princípios constitucionais da igualdade e da universalidade dos dadores
continentais relativamente aos dadores das Regiões Autónomas da Madeira e dos
Açores.
A citada lei, de forma genérica e
abstracta, define a dádiva de sangue (artigo 4º), enumera os deveres (artigo
5º) e os direitos (artigo 6º) do dador de sangue e declara a autorização de
ausência das actividades profissionais (artigo7º).
Mas todos os princípios que orientam a
dádiva do sangue carecem de desenvolvimento próprio que apenas a regulamentação
da lei pode garantir quanto à sua execução.
É do conhecimento público e, por isso,
facto notório, que a dádiva de sangue baixou em termos nacionais, começando a
ser alarmante a dimensão negativa desta realidade pelas repercussões que
acarreta. É caricato que agora venham
com apelos na comunicação social quando, muito bem sabem, as principais causas
desta notória quebra, aliás, há muito prevista!
O
Governo faz o aproveitamento das colheitas de sangue que recebe benévola e
gratuitamente dos dadores de sangue para a produção de derivados e fornecimento
dos hospitais, introduzindo-os no comércio jurídico e científico da
especialidade.
O Estado Português reconhece a
importância das associações de dadores de sangue e considera-as como
organizações cujo objecto consiste na promoção altruísta e desinteressada da
dádiva de sangue, estimulando essa prática entre os cidadãos, tal como decorre
do disposto no artigo 8º, nº 1 e 2 da Lei nº 37/2012 de 27 de Agosto, que
aprovou o Estatuto do Dador de Sangue.
Recordo que para se ter conseguido
elaborar este projecto-lei foram necessárias efectuar extraordinariamente
deslocações à Assembleia da República aonde efectuámos sessões de trabalho com
os grupos parlamentares da Saúde e Educação, vice-presidente da AR e chefes de
gabinete.
A denuncia desta situação tem,
simplesmente, por fim dirigir recomendações, a quem de direito, e intervir na
tutela dos interesses colectivos, com o fim de se repor a legalidade e proceder
à regulamentação da Lei que aprova o Estatuto do Dador de Sangue.
Já solicitámos uma audiência ao Provedor
da Justiça. Caso o nosso desígnio não seja acolhido a contento dos que
benevolamente “dão parte de si” equacionamos uma ida a Bruxelas...
Para criar inimigos não é necessário
declarar guerra, basta dizer o que pensa! Martin Luther King
*Cidadão
Fonte: Barlavento – Semanário Regional
do Algarve
Portimão, 21 de Fevereiro de 2014
Escrito de acordo com a antiga
ortografia
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