2.04.2013

Aveiro: Há quem queira os carros de volta à Rua Direita



Aveiro: Há quem queira os carros de volta à Rua Direita

Inquérito feito pela Associação Comercial pergunta pela reabertura daquela artéria central ao trânsito (Autor da Imagem: Eduardo Pina)
O que provocou a desertificação da Rua Direita? Há explicações para todos os gostos: a saída de serviços públicos, a perda de habitantes, a pedonalização da via, a criação do Fórum Aveiro e de outros centros comerciais na cidade, a quebra do poder de compra… Não há uma resposta única para explicar a decadência daquela que foi outrora uma das principais artérias comerciais de Aveiro. Mas perante o actual cenário de cada vez menos moradores, lojas ou clientes, há quem procure soluções para reanimar a rua.

Uma delas pode ser a reabertura ao trânsito, defendem alguns comerciantes. Paulo Marques gostaria de ver carros a circular “dos CTT à Ponte-Praça” e disse-o num inquérito que a Associação Comercial (ACA) promoveu junto dos lojistas locais. A “grande maioria” dos comerciantes é a favor desta iniciativa, garante o deputado municipal do CDS. Paulo Marques defende, porém, uma circulação controlada, feita “a baixa velocidade” e sem acabar com a função pedonal da rua.

Jaime Ramos, dono de um café aberto há 30 anos, será dos poucos contra o regresso do automóvel. “A única solução é trazer os serviços públicos de volta. Sem isso, nada feito”. “O que há de diferente ou de único que obrigue alguém de Esgueira ou de S. Bernardo a deslocar-se aqui?”, interroga.

Fernando Marques, presidente da Junta de Freguesia da Glória, eleito pela coligação PSD/CDS, é um dos defensores da reabertura ao trânsito. “Só não encabeço um movimento para que os carros voltem a circular nas ruas que foram pedonalizadas porque seria contrário à minha posição anterior”, disse em Assembleia Municipal.

Jorge Silva, presidente da ACA, não esconde “muitas preocupações” com a situação do comércio na cidade, havendo “várias razões” para o actual definhamento. O inquérito aos vendedores - ainda sem resultados divulgados - insere-se num estudo que a associação tem em curso para fazer um diagnóstico rigoroso e procurar saídas para a crise. A instituição lançou também o Cartão Espaço Aveiro, no âmbito da Agência para a Modernização e Revitalização do Centro Urbano, que garante vantagens aos clientes do comércio tradicional.

“NÃO EXISTEM”
O debate sobre o futuro da Rua Direita está aceso nos jornais ou nas redes sociais. “Ao passar pela Rua Direita contei as lojas vazias. Desde o início, nas pontes, até à Casa Martelo, contando com as da Praça Marquês de Pombal, são 19 lojas vazias. O que se passa com esta cidade? A crise não explica tudo”, assinala Rosa Pinho, investigadora da Universidade de Aveiro (UA). A reabertura aos automóveis não é solução. “No Fórum há sempre muita gente a andar a pé. Falta ali um pólo de atracção: uma repartição pública movimentada, uma feira de artesanato semanal, uns baloiços”. E critica o “culto do automóvel”, que “não existe em mais nenhum país da Europa”.
Este é o cenário da rua dos Combatentes da Grande Guerra, mais conhecida por rua direita. No passado não muito longínquo a circulação de carros era feita por aqui em frente do tribunal. Hoje as lojas abertas contam-se pelos dedos duma mão.

Hugo Cavaleiro, um dos sócios do Fusion Cowork, um espaço de trabalho partilhado junto à Rua Direita, concorda. Não é por falta de carros que aquela artéria está a morrer, mas por causa do decréscimo de moradores, do abandono de serviços e da “total ausência de proposta de valor da maior parte do comércio presente”.

Para André Costa, membro da associação AgoraAveiro, “o problema não é certamente a ausência do automóvel”. “A zona comercial mais activa em Aveiro é o Fórum, que reúne três condições similares à Rua Direita: zona pedonal, estacionamento subterrâneo pago, área central da cidade”. Então o que é o que o Fórum tem que a Rua Direita não tem? “Estratégia de marketing profissional, lojas-âncora com enorme capacidade de atracção, comerciantes com capacidade de se adaptarem por obrigação da entidade gestora às necessidades da população”, responde.

André Costa apela a um “trabalho concertado” da Câmara e da ACA, mas também à “capacidade e vontade dos comerciantes se adaptarem à mudança”. Um dos problemas, reconhece, é a dificuldade em encontrar lojas-âncora que queiram investir. Mas acrescenta: “Nós também somos culpados, pois alterámos os nossos hábitos e preferimos muitas vezes ir a grandes superfícies”.

A Gonçalo Fonseca, da empresa que durante oito meses explorou a esplanada na Praça Marquês de Pombal, o regresso dos automóveis parece uma “má ideia”. A escassez de clientes inviabilizou o negócio. “Todos os meses foi necessário pagar o que a falta de pessoas não pagou”, diz o deputado municipal do PS. “Estas são as alturas em que as entidades públicas e associativas mais devem intervir, porque é manifesta a incapacidade de consumo, porque os comerciantes não têm margem para pagar nem uma iluminação”, assinala. “Os comerciantes não se devem pendurar em ninguém, mas devem ser tratados como agentes económicos fundamentais para uma boa vivência urbana”.

Gonçalo Fonseca critica a ACA e a Câmara. “Não existem”, avalia, sustentando que “grande parte do que se pode fazer custa muito pouco dinheiro ou nenhum”.

TERCEIRA VIA
Sugestões não faltam para dinamizar a rua, como a instalação de um parque infantil na Praça Marquês de Pombal. “Em cidades como Milão e Turim as galerias comerciais são uma animação. A Rua Direita podia ter uma cobertura e ser um espaço de passeio com conforto”, propõe, por sua vez, Luís Souto, ex-presidente da Associação para o Estudo e Defesa do Património Natural e Cultural da Região de Aveiro.

José Carlos Mota, investigador da UA na área do planeamento, pede que se encare uma terceira via. “Quando se discute o futuro da Rua Direita surgem normalmente dois tipos de propostas: a do regresso ao passado (da rua comercial fervilhante) e a da aproximação ao modelo Fórum”. No entanto, “nenhuma delas é, neste momento, possível, quer por falta de investidores/consumidores, quer porque o modelo de gestão e de propriedade não são compatíveis”. O docente defende, por isso, uma “outra função, que não só a comercial”, para a rua, remetendo para “experiências interessantes” noutras cidades do mundo de acordo com o lema “low-cost” e “alto impacto”.


Jornalista: Rui Cunha
Edição de: Terça, Fevereiro 5, 2013



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